segunda-feira, 3 de abril de 2017

De tudo o que eu não consigo dizer

Calma. Me desculpa. Espera. Deixa eu tentar organizar o que quero dizer. Assim.

Aqueles finais de semana no seu apartamento, sabe? Noites com cerveja, vinho, cigarro, e suas músicas para distrair os momentos de silêncio. Talvez através da sua seleção eu soubesse melhor quem você é. Sei que naquela vez em que você me deixou esperando sem querer e que fui até você meio bêbada, meio brava, meio triste não teve cerveja e não teve música. Teve vinho e teve cigarro. Teve você, paciente e disposto. Tudo bem, não está mais lá quem ficou chateada e se embebedou.

Só que eu estou aqui. Querendo saber mais coisas remotamente pessoais sobre você sem que uma expressão de pavor cruze seu rosto. Então, com quantos anos você perdeu a virgindade? Já foi a algum show do Whitesnake? Você teve sarampo quando criança? Você foi criança um dia, não foi? Como era sua mãe? Você me quer apenas como sua garota de final de semana? Eu quero mais.

Eu sei o que você vai dizer. Mentira, não sei. Mas gosto de fantasiar alguma coisa mais ou menos parecida com “Já estamos juntos desde dezembro, não estamos? Você ainda quer que eu fale? Desculpe, linda, isso já é pedir demais. Pensei que minhas intenções estivessem implícitas”. Aquele seu jeito sensato, coerente e ao mesmo tempo delicado de esfregar a suas razões na minha cara. Odeio quando você está certo, coisa que acontece quase o tempo todo. Além do mais, não é justo. Você já me viu meio embriagada, sentada na sua cama, quase chorando de saudades de algo que eu nem tenho. Você já me viu chorando ao seu lado dentro do seu carro, no meio de uma conversa afetuosa, dramática e significativa, enquanto eu tentava fingir que você não é tão importante.

Enfim, em quatro meses você me viu chorando 43% do volume esperado para o ano inteiro. Mas é que, sei lá. Isso tudo, todo esse medo do nada-acontecer ou do tudo-acontecer-rápido-demais tem me deixado cansada. Nada demais. Você sabe montes de coisas sobre mim, muito porque fico tagarela quando fico tímida, porque sinto vontade de te contar toda a minha história e acho que está sempre faltando um algo mais – por que se contentar com o ótimo, se pode ficar perfeito?

Vocês meninos têm disso? Tipo, quando jogam videogame, desmontam motores ou fazem fogo, vocês trocam ideias, buscam saber o que o amiguinho acha a respeito disso e daquilo? Tudo bem, eu sei que não.

Pode ficar aí, na sua, quieto, não se faz necessário reunir forças para mover lábios e cordas vocais para responder qualquer coisa que seja. Não quero incomodar, mas, vai, solta pelo menos um murmúrio ou me manda calar essa minha maldita boca.

Passear pela calçada contigo tem a mesma sensação de ir a um bom restaurante concorrido. Na sua testa está escrito RESERVADO, e eu espero de verdade que o lugar seja meu. Sabe, eu tenho adorado sentar à sua mesa e experimentar sua comida bonita, colorida, aromática, sedutora e cheia de sabor. Nunca me importei muito com a receita, os ingredientes e a forma de preparo. De todos os locais onde jantei, todas as vezes evitei descobrir ratos e baratas e outras guarnições escrotas nos bastidores daqueles idiotas. Eu não queria me decepcionar. Mas contigo é diferente. Eu preciso saber. Como vou saber se estou pisando em ovos se você não me convida para conhecer sua cozinha?

Me diz alguma coisa, vai. Me fala tudo aquilo que eu ando louca pra ouvir da sua boca. Sussurra, então. Ao pé do meu ouvido, enquanto sua língua brinca com meu pescoço e minha mão corre pelas suas costas. Ou me ensina a receptar telepatia, esse idioma que só os inteligentes e evoluídos e incógnitos e brancas-nuvens conseguem decifrar. Porque eu já estourei minha cota de intuição.

Diz que me adora, que gosta de mim, que sente saudades minhas e uma vontade insana de me ver em plena quarta-feira. Sei que não muda nada, mas eu preciso ouvir. Ou isso, ou eu pego meu carro e dou o fora daqui. Agora. Sabe, não está dando muito certo, às vezes eu me sinto meio o Dick Vigarista gritando para o Mutley fazer alguma coisa. E você só olha meu desespero patético e fica me encarando com esses olhos castanhos que fazem com que eu perca minha linha de raciocínio e esqueça tudo o que eu planejei te falar. E então? Como vai ser?

Desisto. Eu acho, às vezes, que seria mais produtivo perseguir pombos em praça pública. Bem, eu só queria dizer que, apesar desse seu jeito todo iceberg de ser, eu te acho um rapaz incrível. Você é o melhor ser humano entre os piores que já conheci. Ou o pior entre os melhores. Não sei. Sei que eu inexplicavelmente estou na sua e você sabe disso. Não dá bola, assim que esse ataque ansioso e cheio de angústia cessar, eu sei, não vou me importar nem um pouco se você ficar na sua, se você não ligar de me aturar falando pelos cotovelos, deitada do teu lado.

Nenhum comentário: