quinta-feira, 29 de setembro de 2011

30 Cartas, 30 Dias #14

Dia 14 - Alguém que você se afastou


Às vezes tenho saudade de você. Você é o que me resta de vontade de ter alguém.

"É como se por um segundo eu experimentasse.

Há algum problema comigo? E se fosse sempre assim? Até que ele lê umas coisas, escuta outras, assiste outras. Não é um completo imbecil. Ser presa de vez em quando. Sair sem fazer barulho do banheiro. Enfim, ter a delicadeza do limite de outra pessoa na minha casa. E se fosse sempre assim? Poder levar alguém no almoço do domingo. Ter alguém pra ligar quando chove e a cidade para.
Meu corpo dói demais. Minha cabeça não para. Sempre lista de tudo, para eu poder saber, nos mínimos detalhes, todas as coisas chatas que não vou fazer. Junto tudo, boto números, pra saber do que abro mão e chuto longe e deixo voar. As coisas mas eu fico. E daí já estou presa a outras coisas todas que preciso organizar pra não fazer. Eu organizo minha impossibilidade o tempo todo. Pra saber que deixei de e não fui deixada de. De de quê? Pra ter controle do que não consigo. Eu listo minha preguiça. Eu sei de cor a chatice de tudo que tô desdenhando. E sofro porque sou a certinha da anarquia. Sempre com o cansaço de defender o lugar do meio, com tanta porrada vindo dos dois lados. O morno de ser. O quase de tentar. A corda bamba de se manter. Nem lá nem lá. Cá mesmo. O fato é que agora que perdeu a graça sofrer pra fazer graça, sobrou só essa verdade que nem merece destaque, que nem me assusta mais, de que eu sofro mesmo. Eu sofro muito mais do que consigo sofrer. Então, será, alguém pra valer a pena colocar flores em cima da mesa?

Se eu soubesse quem é você. Se eu visse mesmo. Se você me trouxesse o veneno do mundo. Se você me dissesse coisas malucas que estão antes de tudo isso que você diz, querendo tanto estar depois. Se você pudesse calar a boca. Se ao invés dessas besteiras decoradas que você fala sem parar, pra me mostrar que lê e vê e escuta, você ficasse quieto um pouco, me invadindo do mistério desgraçado de outra pessoa no mundo.

(...)E é isso que me entristece. Você é uma piscina de plástico pra criança. Pra eu retomar meu contato com a água depois do trauma com a cachoeira de milhões de metros e velocidades. E eu molho os pés e posso. Você é uma via acolchoada, para eu voltar a dar os passos, depois do acidente que me deixou sem músculo desejoso.

(...) As pessoas rompidas pelos amores que não puderam suportar, se juntam e seguem. Anos. Casamentos. Mãos fechadas, quentinhas. Isso não é pra mim, ainda que o oposto também não seja. Daqui a pouco, eu sozinha, cacos de vidro. Nem cachoeira e nem piscina. Eu seca. Porque só sei viver esperando ser molhada e não molhada. Molhada me resfrio, gripo, tenho medo de acabar. Seca é a espera e é como posso.


Esse tempo com você, preciso que você saiba: uma saudade imensa de quando eu lambia o diabo. O que secou minhas plantas, minhas larguras, meus líquidos. O amor bom deixa sempre a melancolia de não estar mais morrendo. A saudade do abismo insuportável de se sentir viva. A certeza de que uma hora se volta pro amor ruim, sabendo, de algum lugar que não se pode jamais interferir, que ruim não é exatamente a palavra. A palavra que não se sabe e daí chamamos de ruim."

**Extratos de Tati Bernardi**

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

30 Cartas, 30 Dias #13

Dia 13 - Alguém que você gostaria que te perdoasse



Pedir e aceitar perdão é muito fácil. Quando é com os outros.

Perdoar a nós mesmos é bem mais difícil.

Eu quero me perdoar. Me perdoar por não ser hoje quem eu sempre quis ser com a minha idade. Me perdoar por não atender às expectativas dos outros, por me colocar em tantas situações embaraçosas ou desprovidas de compaixão.

Hoje eu quero me perdoar. Porque, acima de tudo, tudo o que fiz sempre foi em virtude de algo maior. Algo que nem você, nem o Pedro, nem o Fernando, nem o Marco, a Vera ou a Ana poderiam entender. Sempre foi em prol de mim e da minha felicidade.

Muitas vezes por caminhos tortuosos, de maneiras ininteligíveis ou seja lá o que for. Mas sempre [sempre!] foi acreditando que aquilo seria o melhor para mim e para as pessoas que amo.

Hoje me encontro numa posição em que nunca me imaginei. Morando onde sempre quis e louca de vontade de voltar pra casa. Se eu pudesse voltar no tempo... eu não mudaria nada.

Enxerga, mulher! Veja que você só é o que é por tudo o que viveu. Pelos sonhos destroçados, pelos corações partidos, pelos ideais destruídos. Mas também pelo que frutificou, pelo que ensinou, pelo que aprendeu, pelo sentimento de compaixão e amor pelos outros.

As expectativas sobre o que sou são reflexos de quem teve seus próprios sonhos dizimados - e vê a sombra do que eles foram refletida em mim. Mas não. Eu tenho meus próprios sonhos, meus próprios objetivos. Que continuam em constante mudança porque, eu mesma, sou uma metamorfose ambulante [parafraseando Raul].

Não errei, não menti, não prejudiquei. Sempre fui muito clara com todos a respeitos dos meus anseios e das minhas crenças. Nunca desfiz da minha personalidade nem tampouco escondi meus desejos. Eles são o que me fazem levantar todos os dias e pensar que é apenas mais um passo em busca do que me faz feliz.

Tenho que aprender a me perdoar, em definitivo.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

30 Cartas, 30 Dias #12

*Nem vou me dar ao trabalho de escrever muitas linhas nesta.

Dia 12 - A pessoa que você mais detesta ou que tenha lhe causado muita dor




Já gostei de você.

Num passado remoto, que eu nem faço questão de lembrar, me parecia que poderíamos ser unidos, e que perder uma tarde juntos comendo mexerica enquanto nos esquentássemos ao sol seria uma rotina.

Ledo engano.

Não demorei a perceber suas artimanhas, seu neologismo barato e sua necessidade de sempre se dar bem, não importando os meios. Passei um bom tempo tentando remediar a situação, já que nossa convivência era inevitável, mas sua personalidade me inquietava.

Não gosto de pessoas mal educadas, negligentes e manipuladoras. E é exatamente isso o que você é.

Já te disse o que penso e hoje não preciso mais lidar com você, o que já me tranquiliza.

Eu ganhei minha liberdade. E você e seus iguais, não me importa o que ganham ou perdem.