sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Ás de Copas

Eu não consigo dizer o que sinto para quem tanto gosto. Engraçado, é só, sei lá, não consigo dizer. Acontece que quando alguém diz que não sabe demonstrar o que sente, soa como uma confissão, um pedido de ajuda. Quem fala isso é porque está sofrendo, mesmo que às vezes não saiba.

Eu sou o medo de sentir uma alegria que nunca senti, ou uma alegria que senti e perdi às vésperas de se tornar indelével. Eu sou a vergonha de ser, como muitos dizem, vulnerável ao amor, ou, em casos mais graves, uma conversa estreita entre o sentir e o orgulho de demonstrar. A necessidade de aceitação e o medo da rejeição, mesmo que eu não admita. Eu sou um medo tamanho mar-profundo, uma concha que, de tão fechada, ouve de todos por aí que é durona, sendo que, na verdade, só tenho pavor de perder a pérola que há dentro de mim.

Quando a gente diz, da maneira que for, o que sentimos para quem gostamos, a gente envolve aquela pessoa no nosso universo de maneira única. E, felizmente, o nosso universo engloba tudo o que há em nós; os afetos e desafetos, os defeitos escondidos e aparentes, as manias e as loucuras – omitir ao outro as nossas peculiaridades seria uma maneira muito pobre de gostar. Acontece que quando a gente sente que, além de pulsar, o coração formiga, queremos dividir com o mundo, gritar, olhar nos olhos e, sem medir a longevidade das palavras, transportar as formigas que aqui vivem para também conhecer o coração do outro.

Poucos sabem, mas existe uma parcela da vida muito bonita que permeia entre o dizer e o sentir. Sentir é maravilhoso, criamos lugares que nunca imaginamos dentro de nós – profundos, ricos, nossos. Mas, quando a gente fala o que sente, conseguimos transportar os nossos amores para um tapete mágico que, de tão mágico, pode nos levar para onde quisermos. Ver a alegria de quem a gente gosta estampada no rosto é um prazer muito maior do que “só” gostar por gostar; ter a sensação de estar se envolvendo é algo pequenino perto da euforia de dizer ao outro que ele está despertando algo em nós.

Eu ainda não descobri como é divertido dizer, sem pudores, o que se sente, e, pela linda mania que a vida tem de distribuir seus momentos, ter em troca um sorriso de reciprocidade. É como um bom dia com café quentinho e abraço com gosto de eternidade – mesmo que de eterno sejam só as lembranças. A verdade é que a gente perde muito tempo com medo. Perde amores, perde sensações únicas, sorrisos únicos e, por achar que, sei lá, não sei, não consigo, um dia se perde em saudades que, por sua vez, também serão únicas.

Querer ouvir tudo o que se quer, mas não querer falar tudo o que se sente, é injusto com os amores que passam; com os que ficam. Eu te gosto, eu adoro estar com você, foge comigo, estou tão feliz que você está aqui, desce rapidinho, estou com tanta saudade – são palavras que soam feito bálsamo para a alma de quem convive conosco. Uma pena eu não me enfrentar e descobrir como é louco e gostoso esse mundo das palavras que soam feito música.

E olha que eu sei que o tempo passa. Eu sei como a dor de não falar, em longo prazo, amarga a vida. Eu sei o quanto as próximas voltas desse carrossel dão medo. Muito mais medo. Então eu preciso parar de amar a saudade de um dia e começar a gostar de poder gostar, me envolver e falar disso agora

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